22 setembro 2006

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UM GOLPE EM BANCO.

Levou o diretor do Banco Safira para visitar a fábrica de jeans.
Máquinas de costura clicando a mil. Duas moças pararam o serviço e sorriram para o “Comendador”, apelido que ele se dera no banco, para abafar o humilhante “Zé”, que não combinava com o seu porte sofisticado: a loira de olhos azuis e a moreninha de olhos verdes. Gatas de capa de revista masculina, desnudou-as em pensamento o galã empertigado no seu terno de visitar clientes.. Recebeu adeusinho das duas, quando se encaminhava para a sala de estoque de matéria prima. Rolos de fazenda do chão ao teto. Mais adiante, os produtos acabados iam sendo embalados e carregados num caminhão. Dois outros na fila.
- Notei que não examinam as peças antes de serem empacotadas – observou o gerente bancário. - Não usa o controle de qualidade?
- Pra que? – retrucou Geraldo Aguiar, o dono da fábrica, jovem, simpático de fala mansa, porem assertiva: - Nossa empresa adota o sistema de qualidade total. Erro zero, meu amigo. Não se tolera que a mercadoria venha com defeito da produção
Encantado com a modernidade do empresário refletida no lucrativo balanço semestral da empresa recém nascida mas com a pujança da juventude, e com o bilhete com o telefone da costureira de olhos verdes, que lhe fora entregue por Geraldo ao se despedir, o “Comendador” aprovou o crédito de um milhão de reais com garantia de duplicatas. Liberados os recursos,
constatou satisfeito no “lap top” o ingresso dos seus 10% de comissão na conta do Top Bank em Cayman. Constituída há dois anos, a “reserva monetária internacional”, como denominara o seu fundo para aposentadoria, já alcançara o expressivo montante de 350 mil euros. Se o Delúbio chamava “caixa 2” de “recursos não contabilizados” ele bem que podia se envaidecer de ter encontrado uma feliz designação e justificativa para a sua “caixinha”.
No mês seguinte, aceitou sem reservas, a desculpa do Geraldo para as primeiras duplicatas não liquidadas pelos compradores: prazo alongado para atender dificuldades financeiras conjunturais de seus clientes. Continuava confiando na Tecelagem Utopia Ltda., mesmo depois da costureira ter recusado seu convite para a “happy hour”. Frivolidade de mocinha de classe inferior, conclui ele. Não afetou sua alto-estima. Outras, mais inteligentes e tão bonitas quanto, não haviam desprezado o “Comendador”.
Três dias depois de vencida a primeira parcela do empréstimo, ligou várias vezes para a empresa. Ninguém atendeu. Determinou ao gerente da agência mais próxima que fosse visitar a fábrica.
- Fechada. Galpão vazio. Limpo. Caminhões foram vistos no domingo anterior carregando estoques e maquinário – informou Honório, objetivo e experiente funcionário. – É golpe!
- Fui traído! – indignou-se o diretor, mal disfarçando o rubor na face.
Vingativo, informou ao Departamento Jurídico o número da conta do Geraldo Aguiar – identidade falsa do estelionatário, como se apurou depois – no Ásia Banque em Nassau, para onde, com a ajuda da Corretora Diamante, ligada ao Safira, o cliente transferira 200 mil dólares há 15 dias. A operação de “blue chip swap” – compra e venda de títulos do Tesouro Americano - bastante utilizada por renomadas empresas para alimentar suas “reservas monetárias internacionais” fora bem sucedida.
Um mês depois, acionados os meios particulares de investigação que o banco possuía, descobriu-se que a conta do “empresário” não tinha saldo. Alguns milhões de dólares voavam pelo mundo, repousando, de quando em quando, em ilhas paradisíacas. Dinheiro lavado com competência profissional. Mas os extratos mostraram uma transferência de recursos para a conta do “Comendador” no Top Bank., no dia da liberação do crédito para Tecelagem Utopia.
Banco não considera erro perdoável a participação de funcionário em estelionato. Mas preza a imagem. O diretor foi demitido sem alarde.


COMENTARIO: Nessa estória vemos algumas características típicas dos estelionatários de colarinho branco: no ”jovem empresário” - a simpatia pessoal, o poder de sedução e o conhecimento de técnicas administrativas empresariais que levam banqueiros a aprovar créditos, além da demonstração de patrimônio buscando resguardo em contas no exterior. Do lado do banqueiro: a facilitação da lavagem de dinheiro que inclusive bancos estrangeiros afamados praticam para ganhar polpudas comissões, especialmente a percentagem do diretor envolvido. Falta de compromisso com a ética e a responsabilidade social. Ocultação das perdas para preservar a imagem de confiabilidade do banco, indispensável para manter os depósitos de seus clientes. Atenção:a ganância das partes facilita golpes.





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